quarta-feira, 4 de maio de 2016

Crise



Quando todas as janelas se fecham
e não nos olhamos na sala.
Quando o corredor nos transpassa
enquanto passamos calados,
rostos duros, mal encarados,
cada um em sua direção.

Quando a cama é composta de espaços
e nela, mal cabemos, intactos,
cada um desocupando o centímetro
que mede a justa distância
em que cortamos os laços.

Quando tudo isso é
um corpo se inventando no escuro,
resvalando nos cacos de vidro,
sangrando por entre os muros
para que no final,
talvez reste algo a ser dito.

Talvez apenas estejamos
aprendendo que o amor
é um esquecimento desconstruído.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Sombras








 Postos os olhos
sobre a reentrâncias do nada
hoje o que conduz a calma
é esse cheiro de ermo.


A chuva recém brotada
molhado meu cabelo crespo

a grama que sorri lavada
e as cores desse aguaceiro

A névoa e essa flor, a cama,
a bruma que se desfaz no espelho

as sutis linhas desse anoitecer
de inverno
que de mais interno de fato não existe

é o que se traduz nessa confluência
quando se respira o que se pode
quando até o cantar do silêncio é triste.


 Jessiely Soares

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

À Vista.


 
A morte se dá por etapas
e quase todas ela
indiscriminadamente
estão lúcidas, visíveis,
e disponíveis ao tato.

Por exemplo, o olho
esse colorido vínculo
que nos coloca paulatinamente
de pé todas as manhãs.

(Ou nas madrugadas,
se um gato pular no telhado,
e do telhado para o forro
e do forro pra sua cama.)

O caso é que eu toco,
ando, penso, sinto,
cheiro e olho.
Olho mesmo e me despeço.

A morte se dá por parcelas
ou por pagamento à vista.

Toda visão é uma despedida
dessa passagem tão breve,
num bonde desgovernado
que é a vida.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Soul





Eu sempre guardei meus desgostos
em uma caixa de mármore
com aspecto de túmulo.

Sem dizeres.

Hoje, um deles pediu licença
para assentar-se em meu sorriso.

Não hesitei em dar-lhe passagem;
algumas vezes é necessário
que o jazigo seja aberto
para que mine entre os escombros
um assombramento de coragem.



(Jessiely Soares)


Imagem, aqui.

domingo, 4 de novembro de 2012

Habitualidades



Se você
em nossa sala,
entre uma fala e outra,
      perguntar sobre nosso amor,
      saberei dizer palavras soltas 
que não traduzem
absolutamente
nada.

Porque, querido, nós somos feitos
        De uma matéria que, para os outros,
É esquecida:
                 Picotados
                          de papel e sonhos,
                                   flashes de insônias,
Somos, meu pequeno, 
                                              Vida.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Pelo horário de Brasília


 


 

00:35
e o mundo continua seu percurso.

Nesse momento meu homem adormece,
minha filha ressona,
minha mãe entoa suas preces e pede ao salvador
para que me guarde:
- e para que proteja, não só a mim,
mas a todos da terra -
como lhe foi ensinado,

A poesia é a escolha das palavras
no melhor ângulo fotográfico.
é a amplitude de seus significados,
suas melhores poses,
seus aquedutos e pontes levadiças,
seus prazeres madrugáveis.

Poesia é o final dos tempos. Névoa.
Nasce em terreno baldio,
entre cacos de vidro
e lagartixas,
frascos secos de desencanto,
mulheres amanhecidas.

Poesia é bule. E gente passando pra lida.
é a maldição atordoada
que vem secando a boca
suturando a ferida.
Essa que não se aprende
em nenhuma sala de aula.

É a entrega do desassossego.
A poesia estava comigo
antes já do meu começo.



(Jessiely Soares)

domingo, 29 de abril de 2012

Eternity



"I would like two things:

One kiss
and the infinity,
please."


(Jessiely Soares)

sexta-feira, 16 de março de 2012

Ancestrais





Mas eu era como o vento
e como o vento
eu passei.

As marcas ficaram pequenas
e todos os símbolos, antes esculpidos na lava,
agora estavam sólidos.

Tudo já estava longe.

Porque na ordem das coisas
tudo se consome.
Tudo foge.
Até os ares desses tempos amenos se convertem

Só no dia em que as areias amanheceram
com um sereno que nada reconhecia,
e começaram a reconstruir a poeira dos sonhos

espalhando-se...

o que já não existia mais
Acabava por tocar meu rosto.

Desde então você está em mim
e isso parece querer durar a vida inteira."



(Jessiely Soares)


Imagem daqui: Beco dos Poetas

Requiem para uma tarde



Quando é tarde,
e quando todas as copas
de árvores
são grandes sombrinhas de praia,
eu gosto de observar a calma das nuvens.

Encher de paz
as eternas horas
de aflições vorazes.

Deixar a vida ser
como aquela nuvem:
gorducha,
imensa
e com formatos amoráveis.

(Jessiely Soares)


Imagem Peixinho Nuvem Nemo, aqui: Alexandre Acampora

sábado, 7 de janeiro de 2012

Gris




Tenho gosto de cinzas.
O carnaval nem chegou
e já me parece quarta feira.










(Jessiely Soares)

domingo, 1 de janeiro de 2012

Feliz ano todo!



Chegou um ano novinho.



Tenho um milhão de bons desejos para cada um de vocês e espero sinceramente que eles se realizem.

No entanto, não vou repetir aqui que tudo está zerado, que está tudo recomeçando, que isso e aquilo... porque não é assim. Esse ano é continuação do ano que passou, nossa vida é cíclica e precisamos conviver com nossas escolhas.

Claro, tudo é mutável e a qualquer momento podemos modificar tudo, chutar o pau da barraca e decidirmos ser felizes.

Ser feliz é decisão, né?

Esse ano não foi meu melhor ano. Tive algumas alegrias, algumas perdas, algumas tristezas... Mas no balanço geral, eu podia ter sido mais feliz.

Mas, sabe, eu aprendi uma coisa e preciso deixar ela aqui, pra cada um de vocês:

Nunca, entendam, NUNCA, deixem de estar ao lado de quem amam. Larguem tudo por um abraço. Tudo. Isso inclui largar um pouco o trabalho, largar uma aula da universidade, largar o carro na rua. Nunca abandonem aquela pessoa que não veem há muito tempo por causa das 8 horas diárias exigidas pelo patrão. Compreendam: Certas coisas valem o risco. As pessoas que estimamos estão no topo dessas coisas.

Não importa se elas não nos amam, se depois de tudo elas não vão nos dar um abraço ou um sorriso. O que importa é que nós amamos, abraçamos e sorrimos em presença delas. Não façam isso por obrigação, façam por carinho.

E não temam dizer "eu amo você" "eu senti sua falta" "eu amo o seu sorriso", essas palavras podem parecer doidas quando chegam, mas elas deixam um jardim florindo dentro de qualquer um de nós.

Temer é perder, antes mesmo de perder.

Entre tantas outras coisas, eu só queria dizer isso: Não percam a chance do abraço. Não percam.

Tenho vontade de repetir e repetir e repetir, mas acredito que vocês já entenderam.
Quando amamos e demonstramos isso, respeitamos o outro e acima de tudo, respeitamos o nosso sentimento.

Então amem, encontrem, abracem e respeitem. Acho que se respeitar é o primeiro passo pra felicidade.

Então, o que mais desejo é respeito por si mesmo e pelo outro. Respeito por si mesmo para compreender seus próprios limites e respeito pelos outros para entender ainda mais os seus próprios limites.

O seu limite é o começo da liberdade do outro.

Que nesse novo ano, incidam em sua vida o respeito, a coragem, a paz e a saúde. Com esse kit, acredito que as outras alegrias acham-se pelo caminho, procurando-se com cuidado.

Assim sendo, acho melhor desejar-lhes também atenção para não deixar passar uma das esferas do dragão e nem a parada do ônibus. Porque é importante não pular a parada... sim, a parada! Vocês não sabem o que é voltar do Galo da Madrugada, na chuva, e perder a parada... mas isso eu conto em outra oportunidade.

Sem mais para o momento, agradeço cada carinho, cada comentário, cada leitura silenciosa, cada leitura barulhenta, cada leitura que virou cópia e foi lida em sarau, cada leitura que virou ctrl c + ctrl v (com os créditos! \o/) e foi parar em blog, flog e afins... enfim, agradeço a cada um de vocês que pisou nesse solo do Entre Versos e Riscos.

Espero que em 2012 possamos nos encontrar nessa brincadeira de palavras.



Beijos paraibanos,

Jessiely Soares.

Caligrafia



A vida decide ir ficando,
parte por parte,
em cada vão da estrada,
cada ponte mal sinalizada,
na viagem de regresso.

E como se escreve saudades
na eterna revoada para casa
senão em mil frases rabiscadas
nas pautas dos fios elétricos?



(Jessiely Soares)

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Vaga Lux

     

Vagalumes constituem
uma serenata visual
para poetas.

Decerto que para alguns lagartos
as mesmas lamparinas voadoras
constituem, cocomitantemente
um jantar-jantar à luz de velas.

mas, o fundamental
é que à noite
quando saem para um passeio de bicicleta
os poetas costumam perder o ritmo.

e não conseguem permanecer
no
um-dois-feijão-com-arroz.

Normalmente eles vão pedalando
e olhando para o inabitável escuro
lá de trás.

É como se de repente
todos os matagais noturnos
pudessem espelhadamente
refletir estrelas cadentes
e inquietas.

No chão do mundo dos poetas.



(Jessiely Soares)