domingo, 28 de dezembro de 2008

Tua voz

*



Com teu verso
sobre meu rosto

marque-me
como seu vício
inexato,


Enquanto Cash ressoa
(hurt)
inundando o ambiente

Entre...

me fira,
se insira
em meus espaços

De um corte a outro,
me faça
sua

E eu prometo,

nunca mais
me
despedaço.



(Jessiely Soares)

sábado, 27 de dezembro de 2008

Prisma


Para pintar essa madrugada
eu preciso das tintas
que deixei em tua cama

Exilada e extinta,
o que me sobra, faminta,
é um baú de memórias
e uma íris morta,
suja e carbonizada.

Para tingir esse céu negro
de alguma espessa camada
de sombras e lágrimas,

é necessário que chova
as matizes exatas...

Eu preciso de teus olhos,
senão, não haverá cor,
para eu recompor a alvorada.




(Jessiely Soares)



Foto: "Acordo a noite"
Autor da foto: Vieirinha

Dormente



Eu te toquei bem de leve
e tu nem notaste

Eis que a lua jazia
tal qual pedra
e sorria
dos meus sonhos fugazes.

Eu te olhei,
noturna,
e tu nem notaste

Eis que a lua
caia
surda e vadia
sob os meus vagos olhares

Eu parti
era manhã
e tu despertavas

Meu joio e meu trigo,
meu sinal
e sentido
dos girassóis perdidos
em meus olhos seculares...

... te toquei bem de leve,
com mil corpos celestes
e tu nem notaste.



(Jessiely Soares)

domingo, 14 de dezembro de 2008

Vento de levante



*


Na caravana
que cruza o levante
da manhã que nunca termina

antigüidades de oceanos
engolem vidas perdidas
imersas no próprio destino
dos teus olhos desertificados.

Sob ação de desgaste profano,
de tantos mudos enganos
na caravana, da eterna partida
agonizam amores fantásticos.



(Jessiely Soares)

Quando o canto te alcançar



*


Tu, que não me ouves, deverias saber...

Que há agora, distante de ti,
uma ave, pousada.
E canta,
de acordo com o timbre
da minha voz no espelho.

Na tua noite,
sirenes correm a rua,
em busca do paradeiro
de alguém que agarrou a liberdade
por cima dos muros da prisão.

A lua nunca foi tão imensa
quanto para quem a aceitou
com o peito ferido e criminoso.

Madrugadas são palpáveis para quem se oculta nas sombras.

Algum cantador afina sussurros
em alguma das pontes
do rio que te corre nas veias
e alguém adormece na praça
do Arsenal.

Todos já saem pela noite
em busca de luzes amarelas
e vinhos celestiais
Carregam mentiras e passados,
como reflexos de fogos de artifício...

Ao meu redor,
silencioso entre vales,
meu vilarejo dorme.
Uma névoa cai, pesada.

Não há passantes por sob meu peitoril.
E, é preciso dizer, que não os necessito.

Na amarga calma da pequena vila,
a castanheira abriga o pássaro,
pousado sobre o meu parapeito.

E eu vivo a vida inteira, nesse pequeno e absurdo contentamento.

Quem sabe, ao amanhecer
sob o seguro acalmar de tua janela
de terceiro andar,
o som, quem sabe, seja mais,
que simples ecos de metrópole recém-adormecida

Quem sabe, inaudível, ouças...
como um contato benigno com a eterna liberdade,
e já calados, todos os sons que alarmaram a tua quietude,
Quem sabe ouças, sem saber disso,
entre tantas cidades cortadas,
o canto em que tu me habitas, dessa mesma ave.


*



(Jessiely Soares)

sábado, 29 de novembro de 2008

Nau frágil


*


Fio
invisível
me pescou

aflita.

A linha
que me levou

naufragou
barco e pesca

rumo ao teu tesouro escondido.

Dia bendito em que me afastei
do mar na tua rede

tua cama,
oxigênio.

Não sinto falta do meu habitat

Tu me fizeste esquecer
que um dia
tive
sede.




(Jessiely Soares)

domingo, 23 de novembro de 2008

Pintura a Óleo


*


Eu derramei
dois pingos de tinta
na nudez do teu olhar.

Manchei tua pupila.

De agora em diante,
não me presto a ser estátua,
nem quero ser absolvida.

Não escreverei cartas no muros
e nem relembrarei,
teus poemas
se me pedires.

Espalharei versos cegos
e tintas negras
em tuas meias-verdades,

Cegarei as minhas dores
nas cores
da tua íris.




(Jessiely Soares)

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Sobre o Rio Paraíba e a saudade

*

 

Aquela fumaça
- clarão assolando
o meio da mata -

E a placa no meio do barro
que teima em fingir-se de estrada

"Ponte interditada"

Não faziam sentido.

"Acesso a um carro por vez
a ponte do Rio Paraíba.
Peso controlado.
Perigo."

Mas, como? Se meu corpo,
sem contar os adicionais,
pesava por todo o espaço.

Por gosto, guardei no meu peito
seus passos indecisos
e as lágrimas da pequena
por sua ausência.

Enquanto a poeira cobria
aquele sorriso escondido
que nossos rostos fabricam
entre o olhar e a reticência

Eu, atravessando as queimadas
e as pontes desativadas
fui fiando o caminho

fazendo trilhas na noite
da eterna distância ingrata.

Enquanto a cana de açúcar
prevendo a morte da ponte
Queimava para iluminar a estrada.




(Jessiely Soares)

sábado, 1 de novembro de 2008

Abstinência

 
Pintura de:Angel Estevez


*


Sendo, eu,
abstrata
ponha-me
figurante

ao lado da tua sala

prometo
que não serei luminosa

meus últimos anéis
ficaram, insanos,
na constelação

há muito naufragada

Pudera!

Eu não sei mais me ver
no espelho dos teus dias

Tuas hierarquias
tolas, dizimadas

Me puseram sobre o nada
numa mobilidade
invertida.

e antes da luz que viria...

Encha-me de preceitos
espalhe beijos e apelos
e no meio da febre

coloque-me, sujeito,
na tua sala
como poesia.


(Jessiely Soares)

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Constância


*


É escuro
na noite mais antiga
na canção em pleno vento.

É deserto
mesmo quando a chuva
molha
as estradas, as veredas
e as imagens que invento.

E nas coisas que recito
mesmo baixo, sussurrado
sempre há um negro grito

Esse brado escondido

Nessas ruas tão vazias.
Nas palavras que invento.
Nos pesadelos e nos becos,

da poesia como ofício.



(Jessiely Soares)

Intempérie


O que transfigura
a excelsa sutileza
nos mesmos fins de tarde

é que agora
meu mar de Sal
escasso

deixou um desertos de espaços

que pela casa
brincam de piratas.

E a estátua
de nossos olhos
posta de costas
para o nada

- a salvo de todos os males
que navegam nesses mistérios
de casas com luzes
semi-apagadas -

Não mais observa a saudade
espalhada.


(Jessiely  Soares)


terça-feira, 7 de outubro de 2008

Resquícios e guardanapos

 
Debaixo dessa lua
o dia morre bonito
nas confidências de boteco.

 Vinho, e tinto verso

Se tu me deres uma só razão
posso escrever um poema
ou,
virar atriz de alguma peça de quinta
que te fará
perdoar minha embriaguez

Mas, não se deixe levar pelo meu
sorriso.
É etílico e vicia.

Como aquela lenda
de que existe nesses
nossos cantos
alguma dose subliminar de sensatez.

Deixe o sereno morrer...
algum som de violão
vai meditando nossa noite
enquanto a rua
veste-se de alguns rumores
e dá-se por esquecida,

entregues aos contornos
de uma meia madrugada,
com um velho tinto na mesa

e uns retalhos
de poesia.


(Jessiely Soares)

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

antífona





religiosamente
recito teu nome

– meu confessor –

som a som
num brado
sacramentado
nas conjecturas
de um adivinho
faz muito tempo


– séculos talvez –


mas sejamos leves
e as profecias entoadas
serão breves

são o presságio
guardado num códice sagaz

teu grito se esconderá
na bainha em que guardo
o vaticínio e a oblação

não se pode ter tudo
não se pode.


(Rosa Cardoso)

Decorativo

Casa Vazia. Foto de: Fernando Lyra


Suporta

a torta vizinhança
os parentes inconstantes

os inúteis e sua crença
esses amigos de instantes

toda a sorte dessa raça avulsa
não será mais que uma foto

decorando tua estante



(Lanoia)

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Pedaços


Aquela margarida
riscada à caneta
na sua blusa

o tempo e o mundo
apagaram.

Ficou, de tudo, apenas o trapo.

Como o jeito e o sorriso
de estampas de pano
e cheiro volátil.

Destino e vida

feitos de ampulheta intempestiva,
misto de areia, castelo e barco.

Nenhuma garrafa flutua.

Ficou, de tudo, somente o abraço


(Jessiely Soares)

Fragilidade





Seus pedaços
se espalham
pela casa

como cristais de saudades
irremediavelmente pintados
pelas tuas mãos ausentes.

Como
se eu fosse
pedra.
Ou chuva, domingo,
relíquia, mormaço...

Deixei de ser coisa inteira.
De pouco me vale essa noite.
A pólvora a qual não ateei fogo,
incendiou-me...

E no momento em que achei
que todo o meu destino
estava num intempestivo
momento reacionário.

Explodi.

De mim, cinzas.
Na minha fragilidade de estilhaço.



(Jessiely Soares)

domingo, 28 de setembro de 2008

Génese




*

Em todas as palavras
que desenho alheia
em páginas eólicas
enquanto o sono
me pega no colo,

rogo,
para que os sonhos
seguintes
me levem, voláteis,
ao teu encontro.

Sob algum luar,
sem saudades ou destroços...

Entre todas as palavras
que desenho alheia
em páginas eólicas
enquanto o sono
me pega no colo,

eu, deitada tão longe...

re-ordeno as estrelas,
re-incendeio os cometas
e mudo as distâncias.

Re-desenho a nossa vida
sem muro nem vales,
sem estradas covardes:
Em um planeta só nosso.

(Jessiely Soares)

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Oferendas



*


Do fundo dos teus olhos
acalentei dois mundos

contidos na palma da mão,
íris espelhou

passado, futuro...

Se tu voavas, cego, caias.
Cais do meu corpo

poça d'água,
desenho de fundo de mar
que encandeia

os presentes deixados no colo.

Doces, alvos, medrosos,
sutis como o florir da Oliveira:

Dois mundos
passado, futuro

alguns segredos que são nossos,

Nossos passos e destroços,

e teu medo que ainda quebra na areia.



(Jessiely Soares)

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Ilusão de Ótica





Essa imagem que a câmera aprisiona
- bela - não sou eu.

Não vês que esses olhos verdes
não podem, sequer,
caber nesse rosto?

Vulcões em erupção
deixam tudo em lava e cinza...

Mas esse mar,
esses pontos cardeais,
essa floresta viva,

imagens que a câmera aprisiona,
verde, como raio de inverno em Agosto,

Nem minha retina,
Nem minha ruína.


Toda essa sutil transparência
- como espelho e chuva fina,
não passa de meu esboço.



(Jessiely Soares)

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Das velhas noites e da nudez etérea ( Ao meu André e ao Recife Antigo)


Fotografia: Felipe Ferreira

*


Não sei se é algo em tua pele.

Desde o último vinho
restou algo balsâmico
na boca.

Um certo alívio.

E já que não posso
insinuar as ondas
nem tampouco
resvalar na atmosfera

Gostaria de mostrar,
quando me deito no chão,
o quanto Vênus exerce meu desejo
de ser deusa

- na tua estante
junto aos teus livros de literatura -

Ou sobre tua cama.

Mas o que interessa
é que em nossa última embriagada alucinação

restou algo balsâmico
na boca.

Um certo alívio.

Dizer que te amo
foi a melhor coisa que já fiz na vida.



(Jessiely Soares)

Das vidas reescritas


*



Decidiu então,
que sumir seria interessante...

- Por algo que o valha, sempre é -

Mas por aquelas tardes longínquas,
por aquele arrebol de cristal
ou por meus prismas,

- Já não tenho certeza -

Há tempos já não sou mais
aquele rio transparente,
compreende?

Depois da última gaivota virei caudalosa.
Gosto mais de ser solitária que navegável.

Verdades e companheirismos
me afetam profundamente.


(Jessiely Soares)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Dos pequenos episódios enluarados que ferem diariamente


Mas que névoa
que faz mudar a noite quente

quando ela se converte
em lua morta...

Enquanto eu, atirada, numa súbita e remota
revoada de emoções intempestivas

deixei sob o verso,
o suor e a camisa

de quem agora já cruzou a minha porta.

Mas que lua
que se assenta em minhas serras!

Única, como a cúpula Sistina,

como revoltas, como rubras e finas crinas
dos cavalos que pisaram o meu vento

galoparam os sentimentos em seus cascos

e meus pecados escandalosos
e capitais.

Mas, que nada, que vazio,
que noite!

Quando a brisa embriagada de dissabores
vem trazer-me a janela teu retrato.

Que lanceiro, que tristeza, que diabo...

Enterra meus desejos
numa noite morna e clara.

Do cheiro e das lembranças do futuro que'inda não veio
do medo que eu tenho, desse escuro que receio

reapareces como prece
no meio da noite morta

Deixando a brisa rouca, roçando a minha boca

Me engravidando de saudades
com as tuas mãos eólicas.


(Jessiely Soares)

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Possibilidades


*


Se você descesse do seu altar

e aceitasse
o convite que faço

nesse ninho branco
que se acende em rua clara

quando o universo
se converte em meu espasmos.

Eu cantaria mil cantigas
adormecidas

para teu desígnios anteriores,
teus juramentos

Para ser mansa, pura, leve
em seu encalço

para ser verso estrelando
seu firmamento

Se você descesse do seu altar

Lua, floresta,
canyon de nossos riscos

Planetas, satélites
luares-de-maio,
conflitos.

eu, nua, em seu céu
como asteróide.

Você, vestido como astro,
com órbita e luz própria...

convertido em infinito.




(Jessiely Soares)

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Mundo de lá


*


A hora em que mais doeu
foi quando você acenou

E tudo o mais fez-se neblina.

Turva,
Mil graus abaixo de zero.

E quando mil pensamentos
voltaram descarrilados
a mesma estação de metrô

De tantas
chegadas e partidas.

Eu trocaria a imortalidade
- se eu assim a tivesse -
por mil vezes de teu sono profundo

Por teus sonhos difusos
sem as despedidas de inverno

Sem esse medo da vida.



(Jessiely Soares)

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Do gesto mais simples



*

Selvas de medo e tristeza
Em um trem na madrugada a dentro
Na época em que tudo que era vivo
corria perigo.

Vagávamos,
Noite em claro

No último vagão disponível.

Mas tua mão se entrelaçava na minha
e tudo fazia sentido


(Jessiely Soares)

domingo, 10 de agosto de 2008

Vazio


Esse adeus estampado
em uma página branca

dentro dos sonhos seus,

Não precisa de tele-jornais.
Não precisa de sombras,
derivações,
sintomas,
catástrofes,
Museus...

Guerra ou paz.

Só precisa um olhar mudo,
uma mão que escolhe

tudo,

até restar apenas
uma foto em sépia
de réplicas,
de promessas,
de abismos,
dissoluções

dos meus antigos impossíveis...

E nada mais.



(Jessiely Soares)

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Paleontologia



*

Se decidires revelar
esses restos que jazem
dentro de teus olhos
de oceanos extintos

Não hesite.

Há tantos anos
escavo mundos
em busca dos meus pedaços
perdidos em tua Íris,

Fósseis, incrustados, nesse teu azul tão triste.




(Jessiely Soares)

Praga



A todos que nesse mundo
dormem o sono dos justos,
sonhando com as dívidas

eu desejo muitos anos de passado.

E que suas retinas guardem
o lugar mais insano,
e o sonho mais assombrado

Quanto a mim,
que nesse frio de medo
brinco com tua imagem

quero amanhecer com a lua.

Cantando os terríveis sons
de brisas que morreram na noite
da nossa separação covarde.



(Jessiely)

Jardim de Inverno




*

Flores pálidas
pendidas, transparentes

Uma luz branca
esvaindo-se nas vidraças

Canto cortante
cristais mortos de floresta.

Pensar que até ontem
tudo era calor...

Resquícios de aromas
paisagens brancas, desérticas...

Pensar em tudo que eu morri
por tanto amor

O teu medo, inconsequente,
assassinou a primavera.


(Jessiely)

Círculo Polar


Se ao menos
o que quebrasse na distância
fosse o ar
a dor
ou mesmo a letra

eu podia,
arriscando uma centelha
prender uns versos e uns prantos

Mas o que quebra
é mais do que eu posso,

é mais que qualquer coisa
que eu queira,

O que quebra é esse amor
que range os ossos
e que tenta apagar
fatalmente
essa fogueira.


(Jessiely)

Contrastes




Eu tenho, nas horas vagas
criado constelações com teu perfume
e em teu nome, feito explosões
em minha galáxia...

Mas no dia-a-dia nublado
há certos momentos
em que tua luz não me acha.

(Jessiely Soares)

Noites e Pedras





Por essas ruas, por essas luzes amarelas...
Fui deixando pequenos contrastes
- amor e pedra -
por passos não contados no caminho

Medindo
sob estrela e a aquarela
sob o canto do bêbado e a espera
o rubro alvorecer no céu antigo

Conjuguei em versos tais,
- de universo e outros vinhos -
a certeza da entrega
em cálidas noites
de serenos antigos demais...

Os passos não contados
que ficaram de tantas vidas
já não cabem...
nem nessas luzes - segredosas de passados -
nem nessas pedras de rua
de madrugadas imortais.


(Jessiely Soares)



*Foto do Recife Antigo:
http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=518469

Prometeu Sem Coração ( André Espínola)





Com pés e mãos acorrentadas
Às rochas montanhosas,
De alguma região geográfica esquecida do globo,
- talvez inexistente,
ou existente apenas em mim mesmo -
Vejo o passar da noite,
O amanhecer e o crepúsculo do dia.

- a lua é sempre
a melhor companhia.
passo menos tempo com ela,
já o sol, cega,
demora, queima
e destrói minha harmonia -

Não roubei a faísca do fogo dos deuses,
Nem mereço ser prisioneiro de um monte
Para sofrer diante de tal suplício,
Ficar inerte, preso ao chão,
Vendo uma águia vir do horizonte,
Pousar em meu peito, rasgar-me com seu bico,
E vê-la, saciada, devorar meu coração.

Antes fosse um fígado!
Pelo menos teria ainda um coração...


(Autor: André Espínola)




http://andreespinola.blogspot.com




* Por ser tão linda, tive que furtá-la dele.

domingo, 3 de agosto de 2008

Vinho tinto em copo de barro (Anderson H e Jessy)



*

Sol,

beira de lábio encarnado e seco,
onde meus cacos pela casa, onde?

no veneno
que berra,

em pleno átrio,

nomes de artéria,
sonhos de ventrículo
e porres coração, coração, coração...?!

célula suicida,

pára, astuta,

e soca o lixo refletido na vidraça!

Implode o silêncio
Que do nada me afasta
E acende a noite, noite comum, noite sem graça...




*




(Jessiely e Anderson H)

Grand Ópera verídica.





*


Se a mezzo-soprano
te soprasse uma promessa
descuidada e apressada:

Vivaldi nos auto-falantes...
Mozart, rock. tecno-funk...
se a mezzo-soprano
sussurrasse:
...Inquieto esse desejo!

e te desse esse beijo
transformasse tesão
em fato ,
em ato
num canto qualquer...
será que te esqueceria?
será que seria mais fácil?

Fetiche,
Lapso,
Regente,
Saxofone e harmonia

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

se a mezzo-soprano
descuidada e apressada:
tropeçasse no ar

vivaldi soando
funk, punk
e o tombo
sonoro
retumbante

Braços abertos
Como asas, planícies,
Balé, vida e a voz ressonante que
Insiste e
Incide...

Se ela sussurrasse:
e te desse esse beijo
transformasse tesão
em fato, em ato.
num canto qualquer
mozart,
rock... electronic music
colapso.
Inquieto esse desejo!

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

Na noite mal cuidada
de vodka,
vivaldi, lago dos cisnes,
nona sinfonia

Ele, moreno,
Contratenor, Dj, hinduísta.

Com ela, a mezzo-soprano
num drama musical;
Grand Ópera verídica
de uma vida insone.

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

*


(Rosa Cardoso e Jessiely Soares)

Constatação


a nós,

de sonhos imaturos,
foi concedido tão pouco.

Notaste?

um medo
uma janela pro fosso
uma cama, um encosto

e uma distância covarde.


(Jessiely Soares)

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Das memórias



*



Amanheci de chuva
sem muita manha, sem cultura,
p´ra compor uma obra-prima
que saísse qual mormaço
numa manhã de brancura.

Desde que a voz não fosse a minha
e que tu lesses a partitura.

E até escrevi a melodia
como uma coisa miudinha
que se encolhesse com o vento.

Ipê branco até chorou
quando ao canto se juntou
a velha dor arrastadinha

"... Foi numa claridade dessas
que pegado na mão dela
destilei amor
numa manhã

águas claras
e campinas
ela cheirava a coisa antiga
a terra doce, a avelã

E aquele Sol afogado
na terra morta que escorre
do pé de serra
fim de dia...

Morreu na canção que deixo
marcada aqui , rasgada a seixo
Onde faz sombra,
calor que míngua.

Na esperança tão vazia
Que ela cresça, véu branquinho
como bibelô, brinquedo

para saber que a amei tanto
naquela manhã apagada
quando contei-lhe meu desejo

e ela sorriu tão branco
tal qual a flor do Umbuzeiro..."

Passarinho bateu asas
brotou plantação de lágrimas
de saudades e de memórias

Chorei caatinga, sertanejo.



(Jessiely Soares)

terça-feira, 1 de julho de 2008

Pacto


*



Guardei sob teu leito - meu menino -
um par de asas transparentes

que noite dessas, muito quentes,
eu usei para afugentar o teu calor

Enquanto lá fora duas estrelas suspiravam
e as mortes nos levavam ao escuro...

Eu deixei, bordado em teu travesseiro,
um ponto simples numa linha quase cinza

de um triste Sol partido ao meio
de um desejo sempre e tão soturno.

para que não chegasse outra manhã em tua vida

e que a tarde morresse inda mais cedo
e eu fosse a lua da tua noite mais vazia

Como um espírito deitado, insolente
Me deixei, sempre me deixo ao teu lado

ou como um anjo, num desejo escondido,
na morada que eu fiz no teu abraço.



(Jessiely Soares)

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Do gesto mais simples




*

Selvas de medo e tristeza
Em um trem na madrugada a dentro
Na época em que tudo que era vivo
corria perigo.

Vagávamos,
Noite em claro

No último vagão disponível.

Mas tua mão se entrelaçava na minha
e tudo fazia sentido


(Jessiely Soares)

terça-feira, 20 de maio de 2008

Noites e pedras


Por essas ruas, por essas luzes amarelas...
Fui deixando pequenos contrastes
- amor e pedra -
por passos não contados no caminho

Medindo
sob estrela e a aquarela
sob o canto do bêbado e a espera
o rubro alvorecer no céu antigo

Conjuguei em versos tais,
- de universo e outros vinhos -
a certeza da entrega
em cálidas noites
de serenos antigos demais...

Os passos não contados
que ficaram de tantas vidas
já não cabem...
nem nessas luzes - segredosas de passados -
nem nessas pedras de rua
de madrugadas imortais.


(Jessiely Soares)



*Foto do Recife Antigo:
http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=518469

sábado, 17 de maio de 2008

Prematuridade


Prematuridade




Nesses dias de ocaso
ao meio-dia
em que tudo lança, fere, sangra, mata

me deixo em pedras frias na calçada
na esperança de chocar-me
contra o vento

Nesses tempos
em que tudo morre, tudo esfria
desenho a última dor da poesia
que se deixa adormecida ao relento

E por horas, inocentes e mostruosas
espero tua voz
vir me carregar antes do Sol...

Não é o que me dizes que me dói
a minha dor é porque tu não
me salvarás à tempo.


(Jessiely Soares)

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Contrastes


Eu tenho, nas horas vagas
criado constelações com teu perfume
e em teu nome, feito explosões
em minha galáxia...

Mas no dia-a-dia nublado
há certos momentos
em que tua luz não me acha.

(Jessiely Soares)

Poesia enferma


Em todas as odes
que eu nunca fiz
sempre me faltaram duas:

Uma que me faça partir
e outra que me pragueje a cura



(Jessiely Soares)